domingo, 25 de novembro de 2012

TECENDO A VIDA UMAS COISITAS - 318

PITADAS DE SAL – 48


O VENDEDOR DE SAL E OS BURROS 

Caríssima/o: 

No quarto domingo do mês calha bem um conto. A escolha nem sempre é fácil… Desta vez entraremos no reino animal mas tendo ainda por perto o sal. Se me fizer companhia certamente não se arrependerá. A caminho… 

«Vem da Grécia antiga a história da mula de Tales. Representa a esperteza malsucedida. Sobreviveu ao tempo graças a Plutarco. 
Com uma sobrecarga de sal sobre o lombo, a mula encontra um rio pelo caminho. Atravessa-o. 
O sal derrete. O peso se esvai. E a mula, supondo que não era burra, não quis mais saber de outro caminho. 
O dono da mula, que tampouco queria passar por asno, troca a carga do animal. Em vez de sal, sacos de lã. 
A mula toma a picada do rio. Molhada, a lã pesa como sal seco. Por pouco o animal não se afoga. Chega à outra margem. Aprende a lição. E jamais se aventura no rio. 

La Fontaine tratou de incorporar a história de Tales ao seu célebre fabulário. Deu-lhe novo colorido. Rimou-a. Metrificou-a. 
Em vez de uma mula, serviu-se de dois asnos. Sobre o espinhaço de um, o sal. Sobre o lombo do outro, esponjas. 
Nessa versão, os burriqueiros são personagens ativos do drama. Eles montam seus respectivos animais. 
Pois bem, o par de burros mergulha no rio. O do sal, aliaviado do peso, sobrevive. O das esponjas morre afogado. 
Quase leva junto o seu guia. Depois de lutar contra a morte, o infeliz é resgatado por um pastor. 
Eis a moral lafontainiana: “Guiar por cabeças más/não é um bom portamento;/às vezes a dita de um/faz a desgraça de um cento”.» 

Esta é a fábula em verso: 

«Qual romano imperador, 
Um pau por cetro levava 
E a dois frisões orelhudos 
Um burriqueiro guiava; 
Um deles trazia esponjas, 
E qual postilhão corria; 
O outro de sal carregado 
Os pés apenas mexia; 
Um sem custo, outro com ele, 
Montes e vales andaram, 
Até que ao vau de um ribeiro 
Ultimamente chegaram. 
No que levava as esponjas 
O burriqueiro montou, 
E fez ir para diante 
O que de sal carregou. 
Ele o vau desconhecendo 
Pregou consigo no pego, 
Nadou; veio acima, e viu 
Aliviado o carrego: 
Porque o sal, de que era a carga, 
Derreteu-se n'água entrando, 
E o seu condutor, já leve, 
Pôs-se em terra e foi trotando. 
O camarada esponjeiro, 
Que o viu tão leve sair, 
Quis à sua imitação 
Também no pego cair; 

Ei-lo nas águas submerso, 
Esponjas e burriqueiro, 
Todos três bebendo à larga 
Querem secar o ribeiro. 
Tão pesadas se fizeram, 
Por beberem sem cessar, 
Que sucumbindo o jumento, 
Não pôde as margens ganhar. 
O homem lutava com a morte, 
Té que um pastor lhe acudiu; 
Mas o burro das esponjas 
Foi ao fundo, e não surdiu. 
Guiar por cabeças más 
Não é um bom portamento; 
Às vezes a dita de um 
Faz a desgraça de um cento.» 

E para terminar, uma versão mais curta mas não menos violenta: 

«O Burro carregado de esponjas e o Burro carregado de Sal 
Iam dois burros, um carregando um fardo de sal, outro carregando um fardo de esponjas. 
Chegaram à beira de um rio e, teimosos, nenhum quis desviar-se para ir à ponte, que ficava próxima, a alguns metros, e que lhes daria passagem seca e enxuta; o do sal meteu-se pela água dentro, o das esponjas ficou parado a ver o que sucederia ao seu companheiro. 
A água do rio infiltrou-se na carga, e a foi dissolvendo, de modo que, quando saiu do banho e surgiu na outra banda do rio, o burro apenas conservava metade ou o terço do peso que lhe fora posto, e o malandro alegre se felicitava pela sua lembrança. 
Vendo-o tão satisfeito, o outro salta na água, pensando que outro tanto lhe sucederia. 
Coitado! As esponjas chuparam a água; o peso tanto aumentou que, não podendo mais, o burro caiu morto. 

MORALIDADE: Antes de vos resolverdes a fazer como os outros, e de pensardes que bem vos sucederá o que bem lhes sucedeu, vede se entre vós e quem quereis imitar, há perfeita igualdade e semelhança.» 

Manuel 





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